Nota 3,0 Narrativa tediosa compromete boa premissa e conclusão com teor de denúncia
Diariamente nos chocarmos com notícias sobre atos cruéis praticados pelos próprios seres humanos contra os seus semelhantes, porém, mais chocante ainda é constatarmos que eles são mais comuns do que imaginamos e que em geral são motivados pela ganância financeira. E o que dizer quando este real objetivo ainda é travestido de boa ação, tem como alicerce falsos vínculos religiosos que escamoteiam redes criminosas? Produções que se passam em territórios exóticos costumam ter sua própria cartilha de clichês e explorar o tema exposto acima é um dos tópicos mais utilizados. Geralmente os filmes que usam os paradisíacos e ao mesmo tempo misteriosos cenários de países do Oriente Médio gostam de beber na fonte das crenças e lendas locais, podendo cair na armadilha de se tornarem aventuras em busca de tesouros escondidos, suspenses acerca de rituais maquiavélicos, entre outros temas já muito explorados. O cineasta Mark Heller optou em A Passagem por uma trama contemporânea e pertinente passada no Marrocos em meio a um cenário que remete ao passado e a histórias misteriosas. O velho e o novo se fundem nesse país como a certa altura constata o protagonista Luke (Stephen Dorff), um fotógrafo americano, e seu amigo inglês Adam (Neil Jackson, também autor do roteiro), estão viajando a passeio pelo território marroquino e encantam-se com a exótica Zahra (Sarai Givaty), uma nativa que seduz a ambos com seu jeito de recatada e beleza. Os rapazes a seguem até um remoto lugar localizado em uma região montanhosa, mas aos poucos sentem um crescente temor. Adam acaba sumindo misteriosamente e Luke se vê perdido em um claustrofóbico labirinto de túneis subterrâneos e passagens secretas que o levam a uma chocante revelação. A nativa logo no primeiro encontro contou ao fotógrafo a história de Aisha Kandisha, uma lenda local sobre uma mulher que usava sua beleza para conquistar os portugueses que no passado maltratavam e abusavam do povo marroquino, principalmente as damas. Quando fascinados ela os matava ou fazia com que eles brigassem entre si pelo seu amor até a morte, uma forma de conseguir vingar seu povo. Por esse fato, se o turista fosse um pouco mais atento já teria consciência de que a amizade com Zahra seria perigosa.
Apostando em uma temática de suspense e imprimindo realismo ao filme, a premissa é muito boa, mas infelizmente seu desenvolvimento é extremamente monótono, sensação que se acentua pela fotografia escura e falta de iluminação que dão a tônica da reta final, ainda que o início compense com um belo colorido que não agride o espectador, uma tendência pouco respeitada quando cineastas voltam suas lentes para terras pouco conhecidas e então tendem a confundir filme de ficção com publicidade turística. Além do aspecto visual que, embora interessante, é pouco funcional, faz muita falta alguns toques de aventura no roteiro, o clima de sedução de Zahra não é lá muito convincente e para ser um bom suspense o longa carece de um capricho maior para criar expectativas antes dos poucos sustos existentes se concretizarem. É perceptível que Heller queria fazer um trabalho fugindo dos principais macetes desse tipo de produção, mas acabou realizando algo com identidade nula. As coisas só melhoram um pouco quando chegamos aos minutos finais e, por incrível que pareça, porque justamente os clichês mais explícitos entram em cena. As descobertas feitas por Luke entre as tais passagens vão instigando o espectador até levá-lo ao clímax que pode surpreender aos mais desatentos, afinal passa longe de ser imprevisível a qualquer pessoa que tenha um pouco de conhecimento a respeito do Oriente Médio ou cultura cinematográfica. Quantos filmes existem sobre pessoas que viajam e acabam caindo em armadilhas? Só para citar alguns exemplos, Wolf Creek – Viagem ao Inferno retrata um assassino cruel que atuava em uma remota região da Austrália torturando turistas e o próprio Brasil já viu sua reputação de bom anfitrião ser balançada com o longa Turistas. Os momentos finais reforçam o estereótipo de que no Oriente a prática de rituais, sejam por motivos religiosos, para negócios ilícitos ou por pura maldade, ainda é um dos maiores riscos que os estrangeiros correm. Poderiam recorrer a algo mais original e menos degradante à imagem do local, mas, numa visão geral, pelo menos o final, mesmo questionável, salva A Passagem de ser um filme totalmente inútil. Porém, dependendo do ponto de vista, o espectador pode se sentir tão vítima quanto os próprios protagonistas da história.
Suspense - 100 min - 2007
0 Yorumlar